O estilo de Vicente
Depois do primeiro dia de prova, Vicente ficou estressado. Achou as provas de Física e de Inglês muito trabalhosas e Literatura sempre é mais difícil para ele, porque costuma negligenciar o estudo dessa disciplina (Sim, ele sabe disso!).
Além do estresse das provas, tem de lidar com as expectativas da família materna, que acredita que ele vai passar “com certeza” e com as pressões internas de corresponder a essas expectativas. O drama de Vicente não para por aí. Ainda tem a “cara” de desaprovação do seu pai, que ao contrário da outra parte da família, vem duvidando dele em todos os sentidos – da sua capacidade, da sua preparação, de seu discernimento. Não foi um domingo fácil. À tardinha, chegou a ter náuseas. Tentou se distrair, mas qualquer post que falasse da prova poderia ter consequências trágicas – ele também sabia disso.
Vicente adormeceu tenso com a pressão de todos os lados. Durante a noite, a cidade enfrentou um temporal. Ele acordou com o vento e a chuva, mas conseguiu dormir sem grandes dificuldades, apesar de estar bastante preocupado com o tema da redação – escrever não é lá muito o seu ponto forte.
Pela manhã, já não chovia. Sem transtornos pelo caminho apesar do temporal, Vicente chegou cedo à escola. Sabia que estava nervoso, embora não expressasse muito. Sua mãe tentava ajudá-lo com palavras positivas e de confiança, mas era totalmente em vão, soavam-lhe falsas. No fundo, concordava com seu pai, se sentia totalmente desacreditado. Durante todo o ano, tentou se preparar para a redação, escrevia quase toda a semana (falhou uma vez ou outra), mas mesmo assim, não se sentia seguro.
Na hora da prova, tomou um susto ao se deparar com o tema: “O que é ter estilo?” A prova pedia que o aluno dissertasse sobre “singularidades construídas a partir de modelo de outros”. Vicente ficou atônito: não sabia por onde começar. Nas suas filosofices, costumava divagar sobre autenticidade e a sua falta, mas nunca escrevera sobre o assunto. Ele próprio, se achava um cara com estilo, por gostar de rock enquanto funk e sertanejo dominam as paradas. Mas como desenvolver um argumento sobre o tema?
Vicente enrolou, criticou a falta de originalidade das pessoas, deu exemplos de estilos que influenciam os jovens, especialmente na música. Não se sentiu muito seguro dos seus argumentos, muito menos em suas chances de ser aprovado. Saiu exausto. Ficou reflexivo: “talvez tenha que descobrir o meu estilo de estudar e me preparar para o vestibular. Talvez seja somente isso.” Lembrou de uma frase que ouviu, não sabe de quem nem onde:
“Caminhante, não há caminho. Faz-se o caminho ao andar.”*
* A poesia é do espanhol Antônio Machado