Vicente vinha repetindo nas últimas duas semanas, como um mantra, a frase de Schwarzenegger que aprendeu com seu tio: Ok, Vicente! Você sabe a meta. Ele tentou, mas começou a perceber que o mantra já não estava fazendo o mesmo efeito dos primeiros dias. Estava se sentindo ansioso, ainda com aquela sensação de que precisa fazer algo diferente esse ano para manter a persistência nos estudos.
Na aula de Inglês o professor Leo falou de um livro do qual ele fez o prefácio: Vencendo a Preguiça: Autogestão da Força de Vontade nos Estudos. Vicente saiu pensativo da aula:
– Poderia ser esse o caminho? Será que o meu problema é preguiça? Acho que não…o meu problema é falta de foco, de concentração… Eu não sou preguiçoso. Se bem que… muitas vezes, no ano passado, talvez o meu problema tenha sido a preguiça.
Vicente foi para casa tentando se convencer de que não é preguiçoso: Não, não poderia ser esse o seu problema – insistia com seus botões. Se eu comprar esse livro, vou estar admitindo que sou preguiçoso.
Vicente aproveitou que estava sozinho em casa e decidiu ler um pouco sobre o tal do livro, assim teria argumentos de que a preguiça não é o seu problema. Procurou pelo nome do livro. Havia um trecho disponível para leitura. Vicente passou pelos agradecimentos, sem dar muita atenção. Passou pelo prefácio do professor Leo, sentiu “como se ouvisse sua voz falando”. Já estava desistindo de continuar a leitura, nem percebeu que a preguiça começou a tomar conta, quando decidiu ir um pouco mais e chegou na página 12, em que a autora relata:
“Durante 20 anos trabalhando com vestibulandos e concurseiros, foi possível verificar que a maioria das pessoas chega ao mesmo impasse: falta de habilidade para se organizar e gerenciar seus recursos para a autorrealização. A conclusão tem sido sempre a mesma: O problema é que eu tenho muita preguiça. Os seguintes questionamentos são a pauta das sessões:
- Por que eu não consigo aproveitar os recursos que eu tenho?
- Por quê, apesar de ter boas condições intelectuais, financeiras e emocionais, ainda não consigo ter disciplina para estudar?
- Por quê, apesar de saber o que deve ser feito, me perco tão facilmente nos afazeres do dia a dia?”
Vicente parou, perplexo: Então, talvez eu seja preguiçoso, mesmo. É exatamente assim que eu me sinto: tenho recursos, mas não consigo aproveitar! Se isso é sintoma de preguiça, então devo ser… Não teve coragem de seguir a leitura. Para a sua sorte, sua mãe chegou da escola e ele foi vê-la na cozinha. Enquanto ela preparava o chimarrão, Vicente ficou à sua volta, arrodeando, ansioso. Ela perguntou, como de costume, como foi o seu dia no cursinho. Vicente disparou:
– Mãe, você acha que eu sou preguiçoso? – Vicente se assustou. Não tinha planejado falar isso. Agora, iria ter de aguentar a resposta.
A mãe sorriu, e do seu jeito sempre doce, falou:
– Por que você está perguntando isso, Vicente?
Vicente ficou aliviado. Sua mãe não concordou de imediato. Agora tinha que justificar a sua pergunta:
– Hoje o professor Leo falou de um livro, que ele fez o prefácio, sobre a preguiça de estudar. Daí, eu fiquei pensando. Por isso…
– Legal. Talvez seja interessante você ler esse livro para responder à sua pergunta. O que você acha?
– Hã… sim, talvez, pode ser. Eu li um trecho… – falou Vicente, quase inaudível.
– E o que você leu? Parece que instigou esse questionamento sobre a preguiça…
– A autora fala que as pessoas que vão ao seu consultório, pensam que são preguiçosas, porque sabem o que querem e o que precisa ser feito, mas não conseguem ir adiante. Eu me identifiquei com isso. Mas isso não seria problema de atenção? Será que eu não teria que tomar ritalina?
– Claro que não, Vicente. Você não tem problema de déficit de atenção. Bem pelo contrário. Você nunca teve dificuldade de permanecer na classe durante a aula, você nunca precisou de tempo extra para cumprir as atividades. O seu problema é justamente que você não precisou se esforçar muito para ter bons resultados no colégio. Alcançava a aprovação com facilidade. Agora, o vestibular está exigindo um esforço extra que você nunca precisou fazer em sua vida de estudante. Você precisa superar esse gargalo.
Vicente sabia que era isso, que sua mãe tinha razão. Vicente ficou pensando, se sentia cheio de conflitos quanto a aceitar a ideia de ser preguiçoso. Sua mãe interrompeu seus pensamentos:
– Então, Vicente: você é preguiçoso?